Educação para a Espiritualidade

Por: João Luiz Correia Júnior

Introdução

Espiritualidade é um modo de viver, um estilo de vida, um caminho a seguir inspirado em princípios, valores, elementos essenciais, enfim, um espirito que move à ação.

A “espiritualidade” é, portanto, a vida segundo um “espirito” (energia, força vital que anima e impulsiona o desejo de viver…).

De algum modo, todo ser humano caminha na vida motivado por um espirito que o move, que o direciona, que dá sentido à sua existência.

1 Um Olhar a partir da Bíblia

A Bíblia, texto produzido no mundo antigo e que por isso deve ser interpretada com os devidos cuidados à luz dos conhecimentos contemporâneos, ao tratar desse tema, coloca o ser humano adulto, na maturidade da fé, diante da necessidade constante de optar entre dois espíritos concebidos como antagônicos, que movem a humanidade ao longo dos séculos: o espírito deste mundo e o espirito divino.

Duas narrativas semelhantes sobre Jesus, colocam-no diante dessa opção fundamental: uma está no Evangelho segundo Lucas (4,1-13), e a outra narrativa está no Evangelho segundo Mateus (4,1-11). Tomemos a narrativa de Lucas.

Lc 4,1-13 é uma belíssima narrativa sobre o início da missão de Jesus, que lembra as diversas tomadas de decisão que temos de tomar diante das encruzilhadas da vida. É uma excelente mensagem educativa, que desperta para a responsabilidade pessoal diante das tomadas de decisão em inúmeras situações.

O texto apresenta os tradicionais dois caminhos que remete à clássica opção que se tem de tomar entre o bem e o mal:

Lc 4,1 Repleto do Espírito Santo, Jesus voltou do rio Jordão, e era conduzido pelo Espírito através do deserto. 2 Aí ele foi tentado pelo diabo durante quarenta dias. Não comeu nada nesses dias e, depois disso, sentiu fome. 3 Então o diabo disse a Jesus: «Se tu és Filho de Deus, manda que essa pedra se torne pão.» 4 Jesus respondeu: «A Escritura diz: ‘Não só de pão vive o homem’.» 5 O diabo levou Jesus para o alto. Mostrou-lhe por um instante todos os reinos do mundo. 6 E lhe disse: «Eu te darei todo o poder e riqueza desses reinos, porque tudo isso foi entregue a mim, e posso dá-lo a quem eu quiser. 7 Portanto, se te ajoelhares diante de mim, tudo isso será teu.» 8 Jesus respondeu: «A Escritura diz: ‘Você adorará o Senhor seu Deus, e somente a ele servirá’.» 9 Depois o diabo levou Jesus a Jerusalém, colocou-o na parte mais alta do Templo. E lhe disse: «Se tu és Filho de Deus, joga-te daqui para baixo. 10 Porque a Escritura diz: ‘Deus ordenará aos seus anjos a teu respeito, que te guardem com cuidado’. 11 E mais ainda: ‘Eles te levarão nas mãos, para que não tropeces em nenhuma pedra’.» 12 Mas Jesus respondeu: «A Escritura diz: ‘Não tente o Senhor seu Deus’.» 13 Tendo esgotado todas as formas de tentação, o diabo se afastou de Jesus, para voltar no tempo oportuno (BÍBLIA EDIÇÃO PASTORAL, ON-LINE)

Jesus foi tentado pelo diabo (espirito deste mundo)

Diabo é uma palavra que vem do latim, diabolu, e por sua vez originado do grego antigo διάβολος, /doábolos/, significa “maledicente”, “caluniador”, “acusador”, “opositor”, “adversário”, que tem a função de “desunir” (RUSCONI, 2003, p. 122, DICIONÁRIO DO GREGO DO NOVO TESTAMENTO).

E são enumeradas três tentações:

1) “Se és o filho de Deus, manda que esta pedra se transforme em pão”.

2) “Eu te darei todo este poder dos reinos da terra se te prostrares diante de mim”.

3) “Se és o Filho de Deus, atira-te para baixo porque os anjos te guardam”

Contudo, Jesus não se deixou cair diante das tentações dessa força maléfica. Ele estava imbuído, animado, influenciado pela força de um outro Espírito, o mesmo que animava os Profetas e Profetisas da Bíblia, conforme está escrito em Lucas 4,18: “O Espirito do Senhor (o Deus de Israel) está sobre mim”.

2 Questionamentos sobre Espiritualidades em Conflito

Esse texto do Evangelho leva aos seguintes questionamentos:

Qual o espirito que anima você? Por qual espírito você tem se deixado guiar:

a) pelo espírito deste mundo?

b) ou pelo espírito que conduz aquilo que transcende os valores deste mundo, espírito que lhe são atribuídas características divinas, espirito de Deus?

a) Você tem se deixado guiar pelo espirito deste mundo? Espirito mundano, da realidade imanente, que promete apenas bens materiais de valor relativo e vida breve, fugaz, passageira?

Esses valores são expressos em Lucas (4,1-13) a partir do que o diabo oferece na narrativa das três tentações:

– Bens materiais para satisfazer egoisticamente as próprias necessidades, de sua família e do seu grupo de parentes e amigos, sem preocupar-se e muito menos ocupar-se com a fome das multidões excluídas e abandonadas à própria sorte como rebanho sem pastor? (Mc 6,34);

– Poder político baseado na autocracia, isto é, centrado numa única pessoa que usurpa/rouba o poder do povo (democracia); governo ditatorial, centrado nas mãos de uma pessoa ou de um grupo que corrói/corrompe (corrupção) e destitui os outros poderes para governar sozinho de forma autoritária, com plenos poderes em suas mãos;

– Orgulho, arrogância, prepotência para mostrar que é “o cara”, o mito todo poderoso que persegue e mata adversários que ousam contrapor-se, no caminho…

b) Ou você prefere seguir o Espirito que ultrapassa / transcende os valores deste mundo?

Esses valores podem ser compreendidos na contramão do que está expresso na narrativa das três tentações (conforme Lucas 4,1-13), e que foram ensinados por Jesus, conforme está escrito nos quatro Evangelhos (Marcos, Mateus, Lucas e João):

– Bens materiais, sim, pão na minha mesa, sim, mas que seja partilhado com todos: os meus familiares, amigos e todas as pessoas que não pertencem ao meu grupo restrito e que fazem parte da grande família humana. Em Mc 6,30-44, na narrativa da primeira multiplicação dos 5 pães e 2 peixes, Jesus ensinou o milagre da partilha.

– Exercício do poder político, sim, mas que seja exercido por meio da democracia (termo que vem do grego antigo δημοκρατία /dēmokratía/, “governo do povo”): δῆμος /demos/, “povo” + κράτος /krátos/ “poder”. Em Mc 1,16-20, Jesus chama pessoas da classe trabalhadora, homens do povo, para fazer parte do seu grupo de discípulos, com a missão de instaurar o Reino de Deus, outra forma de poder, a partir da periferia do Império Romano.

– Agir com autoridade, sim, mas sem orgulho ou vaidade pessoal, com o intuito unicamente de servir ao Deus da Vida, como servo de todos, em profunda humildade (palavra que vem de “húmus”, terra fértil). Em Jo 10,10, encontramos na boca de Jesus esta frase: “O ladrão (que se apodera do que não lhe pertence) vem só para roubar, matar e destruir. Eu vim para que tenham a vida, e a tenham em abundância”.

3 Educação para a Espiritualidade

A espiritualidade segundo o Espirito que transcende o espírito deste mundo (espirito com atributos divinos) precisa ser conhecida, ensinada, para ser vivida, experimentada, saboreada, e, portanto, acolhida. É uma espiritualidade que vai na contramão do espirito deste mundo.

A Espiritualidade permeada pelo Espirito divino, que transcende o espirito deste mundo, necessita do apoio de um processo educacional, pedagógico, como tudo em nossa formação humana. Daí a necessidade da EDUCAÇÃO PARA A ESPIRITUALIDADE.

Essa educação começa na família pelo testemunho dos pais, dos avós ou responsáveis pelas crianças… Perpassa pela Escola e pelas Igrejas, no caso da Religião Cristã… E permeia a vida toda, por meio de uma busca pessoal…

Conclusão

Muito da Espiritualidade que promove a vida, espiritualidade com valores divinos, nós aprendemos com as pessoas mais velhas, bem próximas de nós.

Concluo esta breve reflexão com uma homenagem especial aos avós. Quantos valores essas pessoas, com sua experiência de vida, têm repassado para seus netos e netas, dentro do ambiente familiar…

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*